Gênio Indomável - A Mulher Ignorada Pelo Nobel
Por: Camila Gomes Victorino
Lise Meitner nasceu na Áustria em 1878. Ela foi a segunda
mulher a obter o grau de doutora em física pela Universidade de Viena. Naquela
época mulheres eram proibidas de realizar cursos de alta educação, porém o apoio
de seus pais foi fundamental para que ela conseguisse terminar seus estudos de maneira
privada.
A física Lise Meitner, ignorada pelo Comitê do Prêmio Nobel.
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Notem que hoje em dia, a educação tornou-se algo tão
corriqueiro, no que diz respeito ao seu direito para homens e mulheres, que
muitas pessoas nem mesmo acreditam que ainda no século XX não era permitido às
mulheres estudar o que quisessem. Aquelas que conseguiam, geralmente provinham de famílias
ricas e mais importante ainda, elas tinham o apoio dos pais e principalmente do
pai (que naquela época era o único chefe de família possível), que por alguma
razão não concordava com a posição oferecida pela sociedade às mulheres.
Lise Meitner foi um desses exemplos e sabe-se que mesmo
sofrendo este enorme preconceito, ela não só chegou a doutorar-se em física
como também pôde se tornar assistente de Max Planck, físico que não costumava
aceitar mulheres como colaboradoras. Como assistente, Lise começou a trabalhar
em colaboração com o químico Otto Hahn, descobrindo o primeiro isótopo de longa
vida, o protactínio.
E 1922, Lise descobriu o efeito de emissão Auger, o qual
refere-se ao efeito em que após a emissão de um elétron por um átomo, um
segundo elétron é liberado.
Lise Meitner |
Interessantemente, o efeito Auger tem esse nome devido a um
cientista homem que descobriu esse
efeito um ano depois de Meitner. Aqui, já conseguimos ver como a história das
ciências e história geral, que aprendemos, é totalmente distorcida a favor da
esfera dominante: o homem branco nascido em país de primeiro mundo. Meitner foi
ignorada quanto à sua descoberta e nem ao menos teve seu nome associado a ela, homenagem dada a um outro cientista, desta vez homem, que descobriu
o efeito um ano depois.
Apesar disso, a brilhante carreira de Meitner não se deixou
abalar. Em 1926 ela se torna a primeira mulher Full Professor (seria um
equivalente de Professora Titular no Brasil) da Universidade de Berlin. Descobrindo
a fissão nuclear em co-parceria com Otto Hahn, levando à premiação de Hahn com
o prêmio Nobel de física, mas não Meitner.
É interessante como o preconceito pode moldar a história e
os acontecimentos. Meitner não só foi ignorada quanto à descoberta do efeito
Auger, como também não foi nomeada ao prêmio Nobel, junto com seu colaborador
Otto Hahn. Acredito que hoje ainda exista muito viés dentro do Comitê do prêmio
Nobel, o que fez, aliás, com que muitos grandes criadores da humanidade, como
Jean Paul Sartre, o negassem por respeito àquelas e àqueles que não o receberam
por preconceito político, de gênero, racial ou de origem.
Lise Meitner e Otto Hahn descobriram a fissão nuclear, mas apenas um foi laureado com o prêmio Nobel.
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Mais preocupante é o fato de que nas escolas não aprendemos
sobre nenhuma descoberta feminina de grande importância. Temos apenas o exemplo
de Marie Curie, mas imagino que este não seja suficiente para incentivar
mulheres a seguir áreas de exatas e biológicas.
Ainda hoje a mulher é associada a profissões de humanidades.
Não há problema nenhum em gostar mais de humanas do que de exatas, mas existe
um problema quando quase não existe interesse do público feminino pela matemática,
física, computação, engenharia e biologia (neste caso um pouco menor).
Muitos, reiterando o preconceito, afirmam, escrevem
livros e até publicam artigos mostrando como a mulher é menos capaz para lidar com
números. Eles olham para a história (totalmente manipulada), vêem as estatísticas,
mostrando que mulheres são minoria no desenvolvimento de tecnologias e de ciências, e concluem precipitadamente que mulheres devem ter cérebros evolutivamente
menos capazes de lidar com desenvolvimento de ciências "mais pesadas" (hard
science) porque possivelmente tiveram o cérebro selecionado para o cuidado com
a cria.
Não caiamos na falácia alheia de ignorantes que se dizem sábios.
Pesquisemos sobre as milhões de mulheres ignoradas pela história. Se formos atrás
não só encontraremos alguns nomes, mas encontramos descobertas femininas que
foram posteriormente atribuídas a homens (como o caso de Lise Meitner). Se formos além, descobriremos o número gigantesco de mulheres assassinadas e torturadas para
valer seu direito de educação e encontraremos também aquelas que aprenderam
sozinhas ou pela família e que mesmo com todas as dificuldades descobriram
coisas que nem podemos imaginar viver sem hoje em dia.
Esta sessão não é só para você que como eu não quer mais ser
enganado. Ela se direciona a todos os professores que querem sim ver suas
alunas fabricando foguetes e não apenas
aprendendo moda. Por fim, ela se direciona a todos os pais que querem dar todas
as oportunidades às suas filhas de se tornarem o que quiserem e não aquilo que
a sociedade lhes impõe apenas pelo seu sexo.
Mulheres não são estimuladas, mas desestimuladas a seguir a área de exatas. É preciso muito trabalho
para mudar esta situação que a própria sociedade reforça.
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Gostaria de homenagear aqui todas as mulheres cientistas que
ainda lutam contra o preconceito machista em suas áreas e principalmente
aquelas que querem ser mães e sofrem com o preconceito vigente contra mães
pesquisadoras. Por fim, homenageio uma amiga física que mesmo um dia tendo
ouvido de seu pai o fato de que física é muito difícil para meninas, não
desistiu e hoje tornou-se uma grande pesquisadora!
Sugestões de nomes de mulheres apagadas, etnias ou povos são sempre bem-vindas. Mande sugestões através dos comentários.
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