Reflexões Sobre Um Veganismo Capitalista
Por: Camila Gomes Victorino
Um veganismo com capitalismo só pode ajudar ao capitalismo e nada mais
Após se inteirar naquilo que
oprime, é preciso analisar até que ponto tudo que se listou é boicotável, pois
comprar roupa de cânhamo orgânico nem sempre está dentro do orçamento. Nisto, o
próximo passo é saber, então como substituir o que não é boicotável e a
solução, neste caso, é optar pela auto-suficiência, produzindo seus próprios
produtos, e pelo anti-consumismo, refletindo sobre o que é realmente necessário. No caso, o site “Pensando ao contrário” dá diversas dicas de como
deixar de consumir certos industrializados e mudar hábitos de pensamento opressores. Por fim, é preciso agir e refletir,
através de atos, abaixo-assinados, criação de grupos, mobilização com veganxs
da região, enfim. Para tal, uma dica é conhecer grupos online próximos de sua
cidade ou mobilizar sua comunidade. Aqui, eu recomendo o grupo: Ativismo
vegano e o grupo veganismo.
Por fim, é preciso dizer que estas dicas são apenas superficiais. Se quisermos mudar o modo como a engrenagem atua, é preciso sempre se modificar e expandir a sua consciência. Ser um boicotador não basta, já que o próprio capital se adapta às novas tendências de mercado, neste caso o vegano! Leia e estude sempre! É preciso entender bem como a opressão emana em nós e também na nossa sociedade. Portanto, se fiar em um veganismo "classe-mediatista", que se baseia apenas em receitas e novos produtos, não será suficiente. De fato, talvez isso seja suficiente para não nos sentirmos culpados em nosso belo apartamento, mas quem dirá o quão efetivo é este comportamento superficial para todos os animais?
Um veganismo com capitalismo só pode ajudar ao capitalismo e nada mais
Na foto: Nós nunca seremos sãos em um sistema insano. Fonte: SarahRHarris |
Veganismo é um movimento que usa
a mudança dos hábitos de consumo para fazer valer os direitos dos animais, mas
não é só hábito de consumo que faz um veganx. De fato, ser veganx ativista vai
além de boicotar produtos de origem animal, pois só isso, infelizmente, não
basta! Na realidade, mais do que o boicote, é preciso que outras ações políticas, como
passeatas, atos e abaixo-assinados sejam criados e é preciso dispersar outras
formas de justiça entre seres humanos, afinal exploração animal tem total
relação com exploração humana.
Assim, ser veganx é ser ativista,
pois o veganx que apenas se resume ao boicote de produtos de origem animal acaba por se estagnar e não
conseguir regredir as ferramentas de opressão que a própria sociedade atual usa para
com os seres vivos em geral.
Algumas pessoas se esquecem que o veganismo também é para as pessoas. Fonte: Dawnofanewera |
Evidentemente, que boicotar já é
um ato bastante importante, entretanto, a limitação
a este conceito de veganx “boicotista” acaba por fazer com que um novo tipo de
veganx apareça nestes círculos: o chamado veganx capitalista. O veganx capitalista, para quem não sabe, é uma pessoa que aderiu ao veganismo por razões diversas, mas não compreende os meandros dos procedimentos de exploração animal usados em nossa sociedade. Assim, parte de seu comportamento se resume a deixar de boicotar empresas exploradoras, apenas porque esta oferece uma opção vegana em sua linha de produtos; chamar críticos de seu comportamento de polícia vegana; usar de palavreado homofóbico, machista e racista para descreditar outros grupos ou dissidentes e se resumir ao boicote de produtos de origem animal, quando, na realidade, outros produtos não diretamente relacionados ainda assim representam uma forma de exploração indireta do animal (inclusive humano). Por fim, o veganx capitalista costuma apoiar políticas totalitárias, agressivas e direitistas para com humanos, geralmente devido ao fato de que certo candidato, partido ou governo "beneficia" certo setor animal, mesmo que em detrimento de outro setor (o humano ou o mais geral, como ecossistemas).
Bem, isso parece algo raro, mas eu resolvi escrever este
texto porque estive bastante perplexa pelos meus encontros aleatórios com
veganxs de direita pela internet. Minha primeira experiência surgiu quando
conheci alguns veganxs favoráveis à pena de morte e uso da violência policial
contra ‘infratores da lei”. Também tive a péssima experiência de cruzar com um
vegano, que não gostando de minha opinião, usou-se de seu vocabulário sexista e chulo para me colocar no meu lugar de mulher e calar a boca. Evidentemente que passei por muitos
outros exemplos, o que só veio a aumentar a minha preocupação para o fato de
que o veganismo (que está crescendo muito) ainda não consegue saber exatamente
o que seria um veganx e qual postura assumir quando a exploração indireta dos animais e a exploração direta de humanos está envolvida.
De fato, o problema de se limitar ao boicote e somente a ele é
que não sabemos, por exemplo, se se considera veganx alguém que não compra os
produtos de uma indústria leiteira, por exemplo, mas consome a única opção de
leite de soja da companhia. Também não se sabe até que ponto se é veganx quando
este/esta não tem preocupações para com o modo como o vegetal que come foi
feito (transgênico / agrotóxico / orgânico), o qual, dependendo do sistema de produção, mata - aos poucos ou indiretamente - milhares de animais. Por fim, será veganx, uma pessoa
que tem uma conduta misógina/sexista, homofóbica e racista ou mesmo totalitária
para com alguns grupos de seres humanos (presidiários, por exemplo), mas, ao
mesmo tempo não consome nada de origem animal?
O movimento vegano deve refletir sobre como o capitalismo está tentando transformar o movimento em um estilo de vida alternativo, destituindo-o de seu caráter ativista. Fonte: Mexican Vegan |
Bem, são muitas questões e elas
são importantes porque mal ou bem, constituir um movimento vegano baseado
apenas no não consumo de produtos de origem animal não possibilita abolir a violência
contra os próprios animais, afinal, a vida na Terra está interligada e destruir
o ecossistema do animal, mas deixá-lo vivo, é matá-lo indiretamente; ou comprar
o leite de soja da companhia leiteira também o é.
Desta maneira, o movimento vegano
deve começar a perceber que libertar os animais não é somente o boicote aos
derivados, mas a todo sistema de exploração, pois não haverá possibilidade de
libertação animal sem que se liberte o planeta inteiro.
Mas isso não é demais? Bem,
infelizmente eu já tive o dissabor de encontrar algumas pessoas veganas que me
demonstraram seu descontentamento com minhas idéias de boicote ao sistema,
afinal, para eles, ser veganx já é muito difícil, imagine então ter que ser
ativista da causa dos direitos das mulheres, dos miseráveis, do movimento
negro, GLBT, boicotar transgênicos, participar dos grupos de ativismo de
sementes crioulas, boicotar o último Smart Phone, andar de bicicleta,
deixar de consumir nas redes de roupas de trabalho escravo chinês, boliviano e
brasileiro, enfim...
Libertação animal não está dissociada de libertação humana. Fonte: MercadoPopular |
Bem, ninguém disse que a revolução iria ser
fácil, mas se entramos no barco da libertação animal e se sentimos em nosso
âmago que chegou a hora de libertar este planeta, é preciso também atuar em todas as
esferas e, desta maneira, não é possível que exista qualquer veganismo que se
identifique com o capitalismo. Claro que eu acredito ser extremamente
importante a existência de empresas veganas no setor, mas é preciso sempre
lembrar que o objetivo do veganismo não é trocar um supermercado multinacional
norte-americano de produtos convencionais, por outro supermercado multinacional
norte-americano de produtos veganos, pois por mais que os animais não estejam
mais sendo assassinados aí para a alimentação, eles estarão sendo assassinadas
dentro de outro contexto de exploração, sendo apagados pela sua falta de
direito de habitat ou ao planeta, em geral. Além disso, a própria miséria em si continuará a assassinar
pela necessidade da fome, pois não pense que o tofu será de acesso de todos em
uma sociedade capitalista.
Bem, até aqui eu já deixei clara
a minha posição em relação ao que é ser de fato um/uma veganx e que o veganismo
não pode apenas se limitar ao consumo em si, mas antes ao anti-consumismo e ao
anti-capitalismo, porém, parece sempre fácil falar no que está errado sem dar
soluções cabíveis, afinal seria perfeito poder boicotar tudo, inclusive o
dinheiro em si, mas quem pode fazer isso, afinal?
Soluções iniciais
Se não houver reflexão, o capitalismo enfraquecerá o movimento, transformando-o em um estilo de vida. Fonte: Camaleão |
Eu comecei esse texto falando
sobre o que é ser um verdadeiro vegan engajado na luta de libertação animal e
que este está intrinsecamente ligado ao anticapitalismo, porém, é preciso
começar de algum lugar. O primeiro passo que devemos fazer, é evidentemente,
tornar-se veganx, mas depois disso é preciso começar a conhecer os produtos/serviços/hábitos que
também oprimem de forma mais direta ou indireta outros seres vivos ou ecossistemas.
São eles: transgênicos, óleo de palma usado em industrializados (este provém de
florestas da Indonésia, saiba mais: "Os perigos do oleo de palma"), roupas de lojas de conveniência (opte por
brechós), entre outros.
Estudar nos ajuda a evitarmos ser Capital Planeta, para nos tornarmos Capitão Planeta. Fonte: Contraditorium |
Nós decidimos! Fonte: IEQ |
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