Os Campos de Concentração de Mulheres: uma Violência Apagada da história
Por: Camila Arvoredo
As feridas infelizmente não cicatrizam e o respeito ainda não vem. Fonte: Shoujocafé |
Campos de concentração são comuns aos nossos ouvidos, pois
aprendemos na escola como judeus, ciganos, comunistas, anarquistas,
homossexuais e negros foram raptados, tanto homens, como mulheres e suas
crianças, para realizar trabalhos forçados, servir à experimentação humana em
pesquisas fisiológicas e morrerem em massa. Os motivos sempre foram a opção
sexual, a religião, o nascimento ou a condição política, mas também houve um
tipo particular de campo, reservado ao gênero, o qual raptava mulheres de
países dominados, para fazê-las trabalhar como escravas sexuais para o exército
e alto escalão governamental.
Eu imagino que vocês, leitores, nunca tenham ouvido falar de
algo tão absurdo e nunca poderiam imaginar que a barbárie do machismo chegasse
a um nível tão supremo como a criação de campos de trabalho sexual forçado, mas
infelizmente, sinto que isto ocorreu, predominantemente no Japão, sendo mais
triste ainda, o fato deste conhecimento ser velado e só agora sendo recuperado
pelos historiadores.
Soldado rindo ao lado de mulheres capturadas para servir aos campos de escravidão sexual. Fonte: ProfeMarli |
De fato, o tráfico de mulheres é até hoje um ramo muito
lucrativo, mas ouvimos sempre que este é realizado por sórdido(a)s capangas,
que às vezes parecem ter o apoio de corruptos do exército ou governo, através
de vista grossa, porém imaginar que durante a Segunda Guerra Mundial, o exército
japonês raptava coreanas, chinesas, filipinas, vietnamitas ou até japonesas e
outras para servir campos / bordéis destinados a políticos de alto escalão e
aos soldados, isso é quase impensável!
Mesmo crianças não eram poupadas. Na foto, menina de casa de prostituição conversa com soldado aliado após fim da guerra. Fonte: Aujourd'hui le monde |
Bem, estas mulheres são chamadas de mulheres de conforto, um
eufemismo bastante ofensivo a todas estas mulheres vítimas de estupros, quase
cotidianos, que confortavam os pobres soldados japoneses, sedentos de sexo.
Atualmente, estas mulheres estão aparecendo na mídia, algumas ainda vivas, e
que começam a contar a sua história passada em busca de justiça. Até hoje estas
mulheres não foram indenizadas pelo sofrimento que passaram e são quase esquecidas
pela mídia de seus países e evidentemente pelo governo japonês, tendo algumas
delas sido raptadas com 10, 11 ou 12 anos de idade.
Além de estupro recorrente, muitas das mulheres capturadas morreram nos campos, vítimas de violência física e doenças. Fonte: VisãoPanorâmica |
As mulheres de conforto, hoje, são tristes senhoras que
apontam com fidedignidade e sobriedade o status da mulher na sociedade:
atualmente, a mulher, ainda vista como tendo menos valor que o homem, não só
ganha menos, sofre preconceito por ficar grávida, amamentar e ser mãe, sofre
por ter uma vagina e uma bunda e por ter seu corpo duramente sexualizado na
mídia e nas ruas, como é apagada da história, tanto como heroína, cientista,
poeta e outros, assim como quando todo um povo a escravizou, sem que ninguém
soubesse, sem que ninguém se perguntasse.
Apesar da censura envolvendo o assunto, o filme "Um canto de esperança" tocou no tema das mulheres de conforto. Fonte: Boas dicas |
Um filme interessante sobre as damas de conforto é o belo
Paradise Road, com Gleen Close, contando a história das mulheres brancas, do Cingapura, feitas escravas sexuais dos soldados e
governantes. Hoje, começamos a ouvir falar dessas mulheres, mas não vamos
esquecer que é bem possível também que estes crimes de gênero e contra a
humanidades tenham acontecido em outras partes do planeta, afinal, estupro é
uma das armas de guerra mais comuns utilizadas pelos exércitos, ontem e hoje.
Dia 18 de maio, deste ano, o prefeito da cidade de Osaka
Toru Hashimoto, Japão, afirmou publicamente que as mulheres de conforto teriam
sido uma necessidade. É uma pena que ainda hoje mulheres sejam vistas apenas
como carga a ser fornecida para alguma necessidade. Esta necessidade, descrita
pelo historiador Yoshiaki Yoshimi, como uma forma de afogar as mágoas dos
soldados para com suas autoridades, foi o que levou ao estupro em massa e
cotidianamente destas mulheres, que até hoje não foram curadas desta tortura,
muitas com mais de 85 anos de idade. Homens comuns, homens da elite, todos
servindo ao exército, não piscavam os olhos quando o assunto
era estuprar e forçar uma mulher a lhes conceder prazer. Homens que nem mesmo paravam
para pensar quando o assunto era violência contra a mulher, hoje me fazem
pensar o que nós somos, não só mulheres, como também homens.
Atualmente, muitas ex-prisioneiras lutam por justiça e reconhecimento de sua causa. Fonte: Orange |
O que somos nós, afinal? Hoje dentro de um aspecto pacífico,
amanhã em uma guerra, o quê? É preciso reinventar o modelo de ser humano, pois
todos nós, criados dentro da violência, carregamos esta herança nefasta de
tempos passados. E hoje, apesar de estarmos tranqüilos e em paz em nosso sono,
nem paramos para pensar em todas as vezes que fechamos os olhos por preguiça e
exaustão, apenas para obter um pouco de prazer (seja sexual ou não), à custa,
talvez, de milhares de vidas!
Não vamos mais fechar os olhos! Não vamos mais nos esquecer
do que realmente somos e redescobrir a fonte de bondade que ainda nos resta em
nosso interior.
Em homenagem a todas estas mulheres, algumas sobreviventes,
outras mortas nos bordéis e a todas as traficadas que ainda
infelizmente continuam a ter clientes.
Paz!
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