Um Mundo Só de Músicos, um mundo só de homens
Por: Camila Arvoredo
A proporção já diz tudo: por que elas são tão poucas? Fonte: Prefeitura do Recife |
Estou aprendendo a tocar violino e estes dias fui na Teodoro
Sampaio comprar um acessório. A Teodoro é conhecida como ponto de referência na
cidade de São Paulo na compra de instrumentos e equipamentos de música e é lá
que músicos de toda a cidade vão ensaiar nos estúdios da região ou pesquisar
preços de encordoamento, acessórios, equipamentos e instrumentos diversos.
Bem, não foi surpresa, apesar de um pouco decepcionante, o
fato de passar por muitas lojas e todos os atendentes serem homens. Não me
surpreendeu o fato de que também os instrumentistas nos pôsteres de propaganda
de marcas de instrumento fossem todos homens e mais ainda, fiquei mais
desapontada com o fato de que os clientes também eram todos homens – exceto eu.
Aprender a tocar um instrumento exige dedicação. Para a mulher é preciso, além da dedicação, a coragem para enfrentar o preconceito. Fonte: Reduto Rock |
Já falei em um post anterior sobre o machismo no meio
roqueiro (veja: “Por um rock n'roll mais engajado”), mas me impressiona o fato de que o problema não está somente
no rock, mas em todo meio musical. Afinal, o que acontece com as mulheres que
elas não conseguem adentrar no mundo da música como instrumentistas, de modo
que seja tão difícil e até raro encontrar mulheres comprando e tocando
instrumentos, criando bandas e compondo músicas?
Percebam, não me refiro somente ao rock, mas mesmo no meio
clássico e na música popular são poucas as mulheres existentes. As mulheres são
público tão restrito, que iniciativas como a orquestra feminina da Avon tiveram que ser tomadas para se fazer visualizar as mulheres maestros e
instrumentistas.
É fácil encontrar cantoras por aí! Há cantoras de samba e de
rock e até cantoras clássicas, mas isso não muda a situação: primeiramente
porque a mulher como cantora é insubstituível pelo seu timbre vocal, o que faz
com que homens ou o patriarcado como um todo não possam substituí-la por um
homem para cantar determinado tipo de música, quando o compositor pede
determinado timbre feminino. Mas e quanto aos instrumentos? Nesse caso as
mulheres são substituíveis e é aí que se vê um grande problema, pois quando se
trata de tocar um baixo, uma guitarra, bateria, violino, saxofone e outros,
elas desaparecem. Na Teodoro me senti esmagada. Onde estão elas? Será que as
mulheres não gostam de música? Ou são burras para não compreender? Por que elas
somente aparecem como cantoras? Ou como dançarinas? Por que são raríssimas as
compositoras? Chiquinha Gonzaga existiu, mas e quem mais?
Maestra Cláudia Feres regendo o Avon Women in Concert. Fonte: Souza Lima |
Ultimamente tenho colecionado nomes de instrumentistas
mulheres, mas não é somente para mim, porque este é de fato um problema sério!
Crianças precisam de exemplos e quando não há exemplos não há criação, não há
mudança! Onde estão as maestras para dar o exemplo às pequenas (notem que o
termo maestra nem mesmo existe no dicionário e meu corretor ortográfico aponta
como erro no Word – testem vocês mesmos)!
Será que se os castrati ainda existissem as mulheres cantoras também seriam raridade? Fonte: Elsyreyes |
Eu tenho uma hipótese: eu acredito que antigamente e mesmo
atualmente a mulher vem sendo oprimida e ensinada para a realização de apenas
uma única função que infelizmente - para o patriarcado – o sexo masculino não
teve condição de assumir: a concepção e cuidado maternal da criança
recém-nascida. Durante todo esse período e para evitar que a mulher atuasse e
competisse com o sexo masculino em todas as outras “áreas”, ela foi proibida de
criar e desenvolver qualquer coisa: de artes, à ciência. Mesmo quando
precisavam delas, dava-se um jeito de proibi-las. No caso da voz, por exemplo,
chegou-se ao cúmulo de castrar meninos para que não desenvolvessem a
vocalização grave típica masculina (os chamados castrati), o que facilitou a exclusão da mulher para o canto por
algum tempo, até que este tipo de prática fosse proibida.
Foi um excesso, mas hoje este mesmo excesso existe de outra
maneira, excluindo a mulher do meio musical. Sempre haverá alguém que me dirá
que existem exceções. Sim, acredito que existam maestras e compositoras,
guitarristas e bateristas, mas convenhamos que algo está errado! Não é à toa
que bandas de homens existem aos montes, mulheres e homens cantem milhares de
músicas compostas apenas por eles e
que quando se trata de música no geral sejam os homens os mais entendidos.
Mulheres insistentes mudam o mundo, mesmo quando o preconceito torna-se um grande empecilho. Veja na fonte sobre mulheres no jazz. Fonte: Jabira trombonista |
Não acho que é apenas a falta de incentivo. Acho inclusive
que as mulheres que ainda sim insistem, curvam-se à pressão de constituir
família e deixar de lado suas carreiras para cuidar do lar; acho que muitas se
sentem pouco incentivadas também pela opressão machista que ainda existe e
largam mão, sem contar o fato de que viver de música como um todo,
principalmente no Brasil, é considerado um verdadeiro milagre.
Mas não desistam! Eu, com muito esforço e apesar dos
problemas financeiros cá estou aprendendo e continuando! Componho minhas
músicas, toco, apesar dos olhares de que sou café com leite ou de que não sou
tão boa e rápida quanto o Zezinho, mas sem problemas! O mundo muda quando
fazemos pressão sobre o status quo e está na hora das mulheres começarem a
colocar a boca no trombone, literalmente, e não só tocar um pouquinho, mas
revolucionar todo o meio musical, afinal, como disse Caetano Veloso, alguma
coisa está fora da ordem!
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